A Hora Azul Novo Thriller Psicológico de Paula Hawkins
Após quase 10 anos do lançamento de A Garota no Trem, que foi um grande sucesso no mundo inteiro, Paula Hawkins volta a conquistar seus leitores com A Hora Azul. Um thriller psicológico que fará você se questionar até onde pode ir um serial killer para manter seu segredo a salvo. Ter sofrido na infância justifica as suas ações? A família na qual crescemos é responsável por quem nos tornamos quando adultos?
A Hora Azul é uma história contada ao longo de 40 anos. A trama vai se construindo no decorrer da leitura das cartas da artista Vanessa Chapman, na volta ao passado em anos específicos e eventos no presente. E no final, o que parecia não fazer sentido, é revelado de maneira extraordinária.
A história
O livro tem início quando Benjamin Jefferies, um antropólogo forense, visita uma galeria de arte e se depara com Divisão II; uma obra de Vanessa Chapman e reconhece um osso humano. Ele então envia um e-mail informando a descoberta. Sebastian Lennox, no entanto, futuro herdeiro da galeria, e James Becker, curador da galeria e seu melhor amigo consideram isso impossível. Como uma artista de prestígio faria algo assim?
O que deixa todos em dúvida é que Julian Chapman, marido de Vanessa, simplesmente desapareceu anos antes sem deixar rastros. E até hoje seu sumiço é uma incógnita. O osso encontrado pertence a Julian? O que aconteceu quando ele visitou a Escócia pela última vez?
“Quando sugiro que talvez, Vanessa estivesse em choque, ela abre um sorriso pesaroso. “Vanessa nunca foi emocionalmente expressiva. Eu não sei o que ela sentiu, mas ficaria surpresa e fosse dor. No mínimo, acho que ela estava aliviada de se ver livre dele.”
A peça precisa ser retirada da galeria e enviada para testes, caso seja comprovado que aquele osso é humano, a quem pertence? Após tantos anos a polícia finalmente descobrirá o que aconteceu com Julian? Quais segredos a pequena Ilha de Eris esconde?
Agora Becker precisa ir à ilha conversar com Grace Haswell, executora do testamento de Vanessa Chapman, e responsável por cuidar de todas as suas obras. Ela, no entanto, não tem interesse nenhum em receber jornalistas, curiosos, e muito menos alguém da galeria. Executar o testamento de Vanessa é abrir mão de tudo aquilo que ela viveu ao lado da melhor amiga, anos de história e cumplicidade, e isso é o que tem evitado ao longo dos anos.
Mas Becker está disposto a fazer o que for preciso para conseguir reaver as obras de arte e conhecer mais de perto o cenário responsável por toda a inspiração da artista que acompanha desde a infância.
Os personagens
A hora azul, mesmo sendo um thriller psicológico e trazendo uma história intensa, tem poucos personagens, porém marcantes. Grace Haswell, James Becker e Marguerite são exemplos disso. A maneira como a autora apresenta cada um deles nos faz mergulhar e perceber as nuances do ser humano em situações que levam ao extremo. O que uma pessoa é capaz de fazer se estiver desesperada? Ou se estiver com medo? Ou precisar lutar pela própria vida?

Carência afetiva versus as expectativas que criamos
O personagem mais marcante é sem dúvida Grace Haswell. No início temos a sensação de que Vanessa Chapman é a protagonista, mas conforme a história se desenvolve percebemos como alguém aparentemente comum sai das sombras e ganha tanto destaque.
Como disse anteriormente, a história acontece ao longo de 40 anos. Durante esse período Grace vivencia 5 momentos que moldam a sua personalidade. O primeiro deles é ainda na infância quando se sente abandonada pelos pais. A experiência é tão dolorosa que ela passa a se sentir uma estranha na própria casa, junto da família; sensação essa que se intensifica durante a adolescência.
Quando está na faculdade outro acontecimento desperta o gatilho de abandono. Dessa vez ainda mais profundo do que na infância, o que a faz buscar tratamento psicológico. No entanto, ela precisa conviver com esse sentimento e se afastar de situações que possam despertar algo ruim dentro dela. É quando decide se mudar para a Escócia e viver num vilarejo próximo a Ilha de Eris.
“Ela sai pela porta da frente e a fecha, inspirando fundo o ar frio e salgado, olhando para a direita, onde a ilha se projeta na baía. Tem uma luz acesa no chalé no porto. Marguerite está acordada. Outra lunática.”
Poderia escrever umas cinco páginas sobre o que senti ao me aprofundar e refletir sobre Grace, no entanto, a carência afetiva é seu traço mais acentuado. Esse comportamento é percebido em diversas situações. Lembra O Fantástico Mundo de Bobby, aquele desenho animado do Canal SBT, em que o personagem via um objeto e criava um universo paralelo? Grace é bem semelhante ao Bobby, ela tem certa dificuldade em dissociar fantasia e vida real.
Alguém é simpático, trata bem, lhe dá atenção, isso é motivo para Grace criar todo um universo em sua mente. Onde ela é importante, querida, e necessária para a outra pessoa. E na maioria das vezes foi apenas um gesto educado. Situações como essa trazem frustração, tristeza e um vazio interior que ela muitas vezes não sabe como lidar. Isso fez surgir ressentimento e uma certa apreensão ao se aproximar das pessoas.
“Temos tempestades três dias seguidos e parece que meu corpo absorveu toda a eletricidade do ar. Eu pinto e pinto, me sinto revitalizada, renovada.”
Outra atitude muito presente em Grace é ser solícita, porém sempre esperando algo em troca. Ela é prestativa, atenta às necessidades dos outros, faz tudo o que está ao seu alcance, fica evidente que sua linguagem do amor é atos de serviço. Mas se decepciona quando as coisas não saem conforme planejou ou não a tratam da mesma forma.
Esse comportamento pode estar relacionado a sua baixa autoestima que vem desde a infância e também da necessidade de validação. Ao invés de fazer as coisas por si mesma, melhorar sua aparência, e ter uma vida mais interessante, ela direciona toda a sua energia na tentativa de agradar os outros. O que na maioria das vezes lhe causa sofrimento.

A influência da arte desde a infância
Quando Becker quer se aproximar de Grace, ao invés de usar os mesmos argumentos de Sebastian, ele é sincero e conta como conheceu o trabalho de Vanessa na infância. E como esse fato definiu seu futuro. Sua mãe usou o salário de uma semana para comprar um pequeno quadro com a paisagem da Ilha de Eris. Quando ela ficou doente, esse quadro era um dos poucos itens que mantinha no hospital.
Após sua morte, o quadro simplesmente se perdeu. Becker passou anos tentando recuperá-lo. Durante esse tempo leu matérias sobre a artista, conheceu outros trabalhos, e se tornou um verdadeiro especialista. O quadro se transformou numa memória afetiva que liga Vanessa à sua mãe. E daí o desejo de trabalhar na galeria e se aprofundar cada vez mais na vida de Chapman.
A autora mostra, nas entrelinhas do e-mail de Becker à Grace, o quanto é importante para uma criança ter contato com a arte desde cedo. Seja visitar museus, galerias, ir ao cinema, pintar, fazer colagem, ler, tocar um instrumento, ou desenhar. Como essa experiência lúdica, de encantamento, de beleza pode inspirar uma criança a criar seu próprio universo.
“Sebastian, que não sabe nada de nada, que tem a capacidade de atenção de um mosquito, que vai atrás de Hirsts e Banskys, e o que mais estiver na moda e for caro. Que é alto, bonito e rico. Que ficou com Helena primeiro.”
Quando eu era criança meus pais ouviam bastante música sertaneja, desde Chitãozinho e Xororó até Milionário e José Rico, isso de alguma maneira me fez gostar de sertanejo universitário e conhecer Fernando & Sorocaba, Luan Santana, Paula Fernandes, Victor & Leo, e João Bosco & Vinicius. Já na adolescência ganhei uma câmera fotográfica analógica, o que despertou em mim o gosto pela fotografia. Desde então se tornou o meu jeito de ver o mundo.
Um amigo meu ganhou um mangá da tia quando tinha uns 8/10 anos, ele leu, mergulhou nesse universo, e hoje tem uma estante cheinha deles. Gosta de Pokémon, Dragon Ball Z, Naruto, Cardcaptor Sakura, Sailor Moon, além de super-heróis como Superman, Batman, Spider-Man, e outros da DC.
Isso mostra o quanto a família na qual crescemos influencia quem nos tornamos quando adultos. Seja no gosto musical, literário, tendência artística, ou mesmo na carreira que escolhemos.
Somos envolvidos nessa viagem ao passado junto com Becker e sentimos uma certa nostalgia ao relembrar momentos de sua infância. Temos empatia por aquele menino que queria se agarrar a memória mais nítida de sua mãe e mantê-la viva.

Violência doméstica, traumas e cicatrizes
Outro personagem secundário, mas muito relevante, é Marguerite. Uma senhorinha que foi casada durante bastante tempo com um homem que a espancava. Algumas surras foram tão violentas que chegou a quebrar seus ossos, deformar o rosto e o mais triste causou traumas psicológicos.
Ele saia para trabalhar, às vezes demorava dias para voltar, isso a deixava em constante estado de alerta. Sempre se questionando quando seria a próxima surra. Muitas vezes precisou ir ao hospital por causa dos machucados, mas em nenhuma delas admitiu ter sido seu marido. A desculpa era sempre uma queda de bicicleta, uma ferramenta do jardim, ou mesmo um descuido.
Após a prisão do marido por outro crime (sem spoiler), Marguerite se casou com um homem bom. Eles viveram em harmonia por muitos anos, mas ele veio a falecer. Agora vivendo sozinha, ela continua na janela esperando o primeiro marido e preocupada quando irá apanhar novamente. O casamento feliz com o segundo marido não foi o suficiente para apagar os traumas.
“Desejo ficar só, mas já estou muito solitária. Como isso funciona? Solitária quando estou só, mais ainda quando Julian está aqui. Nós nunca conversamos, só brigamos…”
Ler esse trecho do livro foi emocionante e triste ao mesmo tempo. Como alguém pode viver dessa maneira? É angustiante pensar que para algumas pessoas momentos felizes podem não apagar ou amenizar cicatrizes tão profundas.
O episódio 3×09 de Cold Case mostra uma situação semelhante, a diferença é que o casal tem filhos o que torna a história ainda mais triste. Além de agredir a esposa, o marido que é policial, faz isso na frente das filhas. Como uma criança crescerá com segurança emocional vivendo nesse ambiente? Mesmo após anos do acontecido, a esposa agora uma senhora, vive com medo do marido encontrar sua filha e lhe fazer algum mal.
Dois exemplos na ficção do que acontece diariamente e é mais comum do que imaginamos. Muitas mulheres permanecem em casamentos infelizes, com pessoas violentas, por não terem dinheiro, lugar para onde ir ou garantir segurança para os filhos. Viver dessa maneira e se submeter a isso, é o único jeito que conhecem. É mais fácil e talvez cômodo do que se arriscar num futuro incerto.
Violência doméstica é um tema complexo, pode envolver bebida alcoólica, uso de drogas, guarda dos filhos, ou questões financeiras, causando desestabilidade e traumas não apenas nas mulheres mas nas crianças também.
Paula Hawkins aborda o tema com delicadeza, mesmo em segundo plano.
O que a solidão pode fazer com as pessoas?
Grace, após a morte de Vanessa, se isola ainda mais na Ilha de Eris. Ela passa os dias em meio ao silêncio, tarefas domésticas e a lembrança viva da artista que considerava sua melhor amiga. Não faz caminhadas, não nada, e deixou o ateliê intocado desde que Vanessa partiu. As poucas vezes que conversa com as pessoas é no mercado quando faz compras, e com Marguerite, uma senhorinha que vive atormentada pelos fantasmas do passado. No restante do tempo somente as lembranças lhe fazem companhia.
A autora aborda de maneira delicada duas situações: o luto e a solidão. Grace dedicou alguns anos de sua vida a cuidar de Vanessa, a amiga se tornou a sua razão de viver, e após sua morte, ela se vê perdida e sem propósito. Grace não tinha outros amigos, outro trabalho, ou mesmo outras distrações que a fizessem ter uma vida fora da ilha. Tudo o que fazia era estar presente para Vanessa.
“Becker inclina-se sobre o volante e olha pelo canal estreito para o trecho escuro de cinza e verde que é a ilha de Eris. Na ponta sudeste, ele vê uma mancha branca: a casa de Vanessa, tão próxima, mas tão inalcançável.”
Em decorrência do luto a solidão se torna mais perceptível. Ela se fecha ainda mais e não deixa ninguém se aproximar. Isso fica evidente quando ela não quer contato com ninguém da galeria, nem mesmo Becker. No entanto, percebemos que estar sozinha lhe traz muito sofrimento. Ela anseia por contato humano, por fazer amizades, e de alguma maneira ser importante como era para Vanessa.
Muitos psicólogos discutem a diferença entre solitude x solidão, e como identificar ambas as situações pode trazer mais clareza e melhor qualidade de vida. Enquanto de um lado há quem aproveite a vida viajando, indo em festas, e rodeado de pessoas; há quem prefira a tranquilidade, a paz, e o conforto do próprio lar. Mas em que momento esse comportamento se torna prejudicial e afeta a autoestima, o amor-próprio e cuidado consigo mesmo?
Um artigo recente da BBC questionou diversos profissionais sobre o tema. A solidão desperta uma sensação desagradável. Mesmo estando num relacionamento, sendo próximo da família, ou rodeado de pessoas, é possível sentir-se sozinho e triste. A solitude, por outro lado, é o tempo que nos afastamos das pessoas, das redes sociais, e do excesso de estímulos para colocar os pensamentos em ordem. Fazer silêncio, respirar, e aproveitar a própria companhia, é algo bem diferente de solidão.
“ao dirigir de volta para o continente, Becker tem a impressão de ver algo no retrovisor. Um flash azul, não o azul do céu nem do mar, mas algo mais intenso, não natural, deslocado. Um azul como um brilho estroboscópio de luz.”
Ficar na ilha foi uma decisão de Grace, ao mesmo tempo que mantém todo o legado de Vanessa, entre obras de arte, diários, fotos e rascunhos; ela se sente deprimida, isolada, como se ninguém se importasse com ela ou soubesse da sua existência. Isso aos poucos entristece seu espírito. É como se ela fosse invisível para o resto do mundo.
Após conhecer Becker, esse sentimento muda, ela vê a chance de eles trabalharem juntos. Enquanto lhe mostra a ilha, as obras inéditas de Vanessa, e conta histórias sobre a artista, Grace se imagina trabalhando na galeria, organizando tudo para a exposição, e tornando o nome Chapman mais conhecido.

Vanessa Chapman: arte, inspiração e crise de identidade
Vanessa Chapman é descrita pela autora como sendo uma mulher alta, de pernas longas, e dona de uma beleza que encanta a todos. Porém, de acordo com jornalistas, sua personalidade não combina com a aparência. A mídia tem uma imagem completamente diferente de Chapman.
No começo da carreira Vanessa teve contato com artistas igualmente talentosos em Londres, porém ela nunca quis seguir o mesmo caminho, usar os mesmos materiais, e fazer parte daquele grupo. Ela sempre sonhou mais alto. Queria seguir a sua intuição, pintar e criar obras que tivessem a sua alma.
Quando enfim decide se separar do marido Julian Chapman ela usa o dinheiro do divórcio para comprar uma casa na Ilha de Eris. Ela finalmente sente que encontrou um lar e pode trabalhar do jeito que sempre quis. As montanhas, a praia, a pedra, a floresta, toda aquela paisagem escocesa é inspiração para Vanessa começar a pintar os seus quadros.
“… os trabalhos de Chapman recebiam elogios, sua aparência (olhos escuros, pele úmida, graciosa, magra) era enaltecida, mas sua personalidade, não. Ela foi descrita por uma série de críticos e entrevistadores como difícil, desagradável, impaciente, taciturna, estridente e cabeça-dura.”
Além da casa principal Vanessa construiu um ateliê, é lá que passa grande parte do dia trabalhando em seus quadros. Em outros momentos ela pega seu material e percorre a ilha buscando novas paisagens para pintar. O mar, o nascer do sol, as noites estreladas, a lua, e muitos outros detalhes da ilha.
Chega um momento em que Vanessa sente a necessidade de inovar, quer criar algo diferente, que mostre a sua nova fase. Ela então tem a ideia de criar esculturas com materiais que encontra pela ilha, desde conchinhas, galhos, penas, ossos, e outros itens que dão vida às suas criações.
Vanessa transforma seus sentimentos em arte, quando vê a escuridão da noite, a força com que a chuva arranca as raízes de uma árvore, ou a mistura de cores num pôr do sol. Todos esses momentos tocam a sua alma e são transformados em algo palpável, surpreendente e real.
Esse é o jeito de Vanessa deixar a sua marca no mundo.
Profundidade e o vazio por não ser compreendido
Outro tema trazido por Paula Hawkins é a profundidade nos relacionamentos, ou o vazio que a relação se torna quando uma das partes não se sente compreendida. Vanessa e Julian são exemplos disso, assim como Sebastian e Helena; e Vanessa e Grace.
Vanessa é uma verdadeira artista, sente tudo com a alma e transforma seus sentimentos em arte. O talento em olhar o mundo à sua volta e criar peças jamais vistas transpira pela pele. Ela consegue admirar uma paisagem e desenhar de tal forma que é perceptível o que ela quis transmitir.
Ela é igualmente intensa no seu amor por Julian, mesmo ele não sendo o marido perfeito ela o ama com toda a intensidade. Quando ele lhe pede o divórcio ela aceita, porém o seu coração se parte em mil pedaços. Ela o deixa ir, mas desejando no fundo que ele fique, que a escolha ao invés da amante.
“Para onde quer que eu me vire, a paisagem fala comigo. A leste, as colinas suaves e arredondadas, tão reconfortantes, tão femininas! Ou em direção à floresta, verde e preta e misteriosa. Se você quiser pavor verdadeiro, é só subir até a rocha e olhar para baixo, para o caos do mar. Neste momento, estou cativada pelo sul, pelas ilhas, por Sheepshead.”
De certa forma Julian percebe toda essa intensidade da esposa, talvez esse seja um dos motivos que ele nunca vai embora de verdade, e esporadicamente aparece na ilha. Não apenas pelo dinheiro, mas por sua forte ligação com Vanessa.
Num outro momento vemos Sebastian e Helena, ambos da alta sociedade britânica. Sangue azul como diz Becker. Enquanto Helena é mais focada, tem consciência de seus privilégios e quer um relacionamento mais maduro; Sebastian é o deslumbrado, aquele que sempre conseguiu tudo do jeito fácil, acredita que as pessoas lhe devem alguma coisa; assim como Grace ter que se desfazer das obras de Vanessa.
Sebastian, apesar da idade, é imaturo. Helena é o contrário. E quando Becker é contratado para trabalhar na galeria ela percebe o quanto são parecidos. Ele é centrado, tem objetivos, um propósito de vida, e não tem medo de defender seus ideais. Cada dia Helena fica mais fascinada por sua personalidade e decide pôr fim ao noivado com Sebastian.
“A pintura nos detalhes de madeira desbotou, algumas das portas do armário estão meio soltas nas dobradiças e as paredes, que talvez já tenham sido de um amarelo-prímula, ficaram da cor de nicotina. Aqui e ali há contornos fantasmagóricos de quadros pendurados por muito tempo e depois removidos.”
Por último, Vanessa e Grace, o relacionamento que possui muitas nuances. Grace, como médica, se muda para a casa de Vanessa com o objetivo de ajudá-la enquanto a mão da artista está machucada. Ela faz compras, limpa a casa, prepara comida, cuida de Vanessa como se a conhecesse a vida inteira. O tempo passa e o sentimento de Grace se torna intenso. Vanessa, por outro lado, a trata com certa distância.
Grace percebe que Vanessa quando está com outras pessoas conversa de maneira alegre e mais aberta sobre as suas peças, as paisagens, a ilha, o que a toca para criar novas obras, e suas inspirações. Porém com Grace ela não age da mesma maneira. Um dia quando a questiona, Vanessa lhe diz que ela não tem profundidade para entender aquele universo. Isso a magoa muito.
Há como, pessoas tão diferentes, manter um relacionamento verdadeiro? Seja amizade ou romance?
De um lado há quem tenha interesse e deseje participar, se fazer presente; do outro, quem precise justificar, mostrar, e muitas vezes não ser compreendido. Como explicar a complexidade dos próprios sentimentos, do mundo das artes, ou do amor que se sente por alguém que não está preparado para ouvir ou entender?

Linha do tempo
A passagem do tempo não é linear, a autora passeia entre passado e presente durante toda a história, o que exige atenção durante a leitura. Alguns acontecimentos são decisivos e mudam a nossa percepção sobre o que vem a seguir.
Num momento estamos com Becker na galeria, no outro com Grace no ateliê, ou ainda com Vanessa enquanto ela tem novas ideias para as suas próximas obras.
1981 – Grace está na faculdade de Medicina
1992 – Marguerite chega à ilha
1993 – Marguerite conhece Grace
1993 – Ano da maior tempestade em Eris
1993 – Nick visita Grace na ilha
1998 – Vanessa pinta quadro de Grace
2002 – Desaparecimento de Julian
2009 – Vanessa pinta quadro importante
2016 – Sebastian é nomeado diretor da galeria
2017 – Galeria herda as obras de Vanessa
2019 – Douglas Lennox morre
2019 – Helena cancela o casamento
Minha opinião
A hora azul foi uma leitura tocante por diversas razões. O fato de Vanessa Chapman ser artista me trouxe à lembrança Um lugar bem distante daqui, de Delia Owens. As pinturas, a natureza, uma mulher isolada do restante do mundo, e principalmente, buscando encontrar a sua verdadeira identidade.
Esse encontro consigo mesma é um momento importante para Vanessa, pois ela não se deixa influenciar pelo trabalho de outros artistas, pelas expectativas do mercado ou da mídia. Ela olha para dentro de si e busca todas as respostas e transforma isso em arte. Vanessa é toda a beleza do mundo, as cores, a natureza, os sentimentos, a entrega, a criatividade.
Grace, por outro lado, representa as sombras. Tudo aquilo que queremos ou precisamos deixar escondido dentro de nós porque o mundo a transformou. Ela, diferente de Vanessa, se deixou influenciar pelo mundo externo, pelas experiências que teve ao longo da vida, e isso de certa maneira a destruiu por dentro.
“Ele não gostou das pinturas que fiz do Palácio de Blenheim, as que todos admiram. Sentimentais, bonitas e artificiais. Ele amou as cercas vivas. Ousadas, disse ele, ambiciosas – levando paisagens numa direção nova. É isso que você quer fazer, não é?”
Enquanto Vanessa transforma em arte tudo o que toca, Grace parece querer destruir tudo aquilo que não pode ter, tudo aquilo que não acontece do jeito que espera.
É interessante perceber essa dualidade entre quem transforma dor em algo belo, e quem a usa como justificativa para ser uma pessoa má. Grace poderia ter agido de outra maneira? Certamente. Há uma linha tênue entre se deixar influenciar pelos acontecimentos da vida e escolher outra direção.
É fato que alguns acontecimentos, principalmente na infância, podem gerar traumas, despertar gatilhos, e transformar uma criança. No entanto, quando somos adultos, é possível escolher entre fazer a coisa certa ou errada. Há crianças que sofreram e se tornaram adultos exemplares, como há outras que tiveram uma boa infância e fizeram más escolhas ao longo da vida.
A escrita da autora é linear, sem picos de intensidade, diferente de A garota no trem. Antes da página 30 criei uma teoria sobre qual seria o rumo da história, quase acertei. Ainda assim, o final foi inesperado. Diferente de outros livros do gênero que o autor entrega um final fechado, em A Hora Azul, Paula Hawkins deixa isso a cargo do leitor o que torna a experiência ainda mais marcante.
A Hora Azul foi o primeiro livro que li enviado pela Livraria Leitura. Uma história tocante, intensa e cheia de significado. Paula Hawkins consegue com sua escrita nos fazer imergir e questionar as ações de cada personagem com maestria. Assim como nos livros anteriores, a curiosidade mantém o leitor preso até a última página. Muito obrigada pela experiência, foi uma leitura marcante.
+Leia também: A mulher na cabine 10
Até o próximo post, Érika ♡
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