Dirty Dancing | aborto, desigualdade e protagonismo feminino

Falar sobre cultura pop sempre desperta bons sentimentos. Aquela nostalgia que mesmo sem perceber nos transporta para outro universo. Seja o velho oeste em De volta para o futuro, achar o tesouro do Willy Caolho em Os Goonies, ou passar o verão num resort chique em Dirty Dancing.

Apesar de Dirty Dancing ser mais antigo que Ghost conheci Patrick Swayze por sua atuação ao lado de ninguém menos que Demi Moore. Unchained Melody (The Righteous Brothers) é uma das minhas músicas favoritas ao lado da inesquecível Take My Breath Away (Berlin) de Top Gun.

É comum assistir o trailer de Dirty Dancing e esperar um musical como milhares de outros. Ao estilo La La Land, Mamma Mia!, Os miseráveis, Nasce uma estrela, Rocketman ou A escolha perfeita. No entanto, apesar do baixo orçamento, ausência de trilha sonora e poucos dias para gravar, a produção foi além trazendo temas delicados para a época e levantando questionamentos sobre aborto, diferença de classe e o papel da mulher na sociedade.

Dirty Dancing
As férias de verão da família Houseman

Baby (Jennifer Grey) é adolescente e vai passar as férias de verão com os pais e a irmã num resort chique em meio a natureza. Ela tem grandes ambições e quer salvar o mundo. Seu objetivo? Fazer parte do Corpo da Paz.

Sua irmã, por outro lado, pensa em futilidades e casar com alguém da mesma posição social. Em meio a jantares, brincadeiras e muita dança Baby conhece Johnny Castle (Patrick Swayze) um bad boy instrutor de dança. Ambos vão aprender que o universo é bem maior do que o mundinho em que viviam.

Apesar da posição privilegiada Baby sonha em fazer a diferença. Desde o início do filme é possível perceber sua inquietação, seu olhar atento e o desejo de ultrapassar as barreiras do mundo em que vive.

Passeando pelas acomodações do resort ela flagra como o gerente trata os funcionários. Esse é o primeiro sinal da hierarquia. Apesar de os garçons serem estudantes de Harvard e Yale eles devem manter distância dos hóspedes. Apenas tratá-los bem sem se envolver romanticamente.

Dirty Dancing
Baby fica impressionada com a dança dos funcionários

Numa noite caminhando Baby descobre um salão onde os funcionários se divertem. Percebe que as danças ali são bem mais ousadas e sensuais que as ensinadas aos hóspedes. O gerente do resort é conservador e as proíbe.

Ao ajudar um dos funcionários levar frutas tem a chance de dançar com Johnny e aprender alguns passos. Mas ele não confia nela. Ao manter segredo sobre o que é feito após o horário de trabalho Baby estreita o relacionamento com eles.

Em outra ocasião, passeando com o filho do gerente, vê Penny (melhor amiga de Johnny) chorando. Ela o avisa e juntos vão ver o que houve. É assim que Baby descobre que a moça está grávida. Num primeiro momento supõe que o filho seja dele. Logo descobre que o pai é Robbie, um dos garçons. O mesmo que está paquerando sua irmã Lisa.

Penny não pode ter a criança primeiro porque é solteira, segundo porque Robbie é universitário e não vai assumir, e por último será dispensada caso a gerência descubra. A única saída é fazer um aborto. Mas ela não tem dinheiro para isso.

Dirty Dancing
Penny está grávida! De quem é o filho?

Movida pela gana de ajudar o próximo Baby procura Robbie e expõe a situação porém ele diz que não fará nada a respeito. Não satisfeita tem a brilhante ideia de pedir dinheiro ao seu pai. Sr. Houseman empresta sem muitas perguntas.

Ao levar o dinheiro à Penny ela não aceita num primeiro momento e Johnny a esnoba por considerá-la infantil e sempre pedir ajuda ao pai. No entanto, acabam aceitando e marcando a visita do médico que fará o aborto.

Devido a operação Penny não poderá se apresentar num outro hotel então o primo de Johnny sugere que Baby a substitua. Será que eles conseguirão ensaiar todas as coreografias em apenas duas semanas? Acompanhamos mais um salto em sua maturidade.

Baby deixa de ser aquela adolescente filhinha de papai e passa a ter objetivos maiores em sua vida. Objetivos esses que a tiram da zona de conforto e a fazem pensar no bem do próximo.

Quando Baby e Johnny pensam que tudo estava dando certo descobrem que Penny pode morrer devido a uma infecção (o cara que fez o aborto não tomou os devidos cuidados). Sem saber o que fazer Baby recorre ao seu pai mais uma vez. No entanto, ao saber que ela se envolve com “aquelas pessoas” ele a insulta e diz estar decepcionado com suas atitudes e a proíbe de ter contato com os funcionários novamente.

Protagonismo Feminino
Relacionamentos, gravidez e aborto como tabu nos anos 1960

O filme em si tem vários pontos altos. A questão da diferença de classes. Obediência. Tratamento. É nítido quem trabalha e quem se diverte. Quem são as pessoas que têm dinheiro e podem passar as férias num lugar como aquele. E também quem sempre será um mero empregado.

Não há diálogo entre patrão e empregados e nenhuma das sugestões apresentadas por eles é ouvida ou colocada em prática. O gerente devido ao seu status tem ciência de que aquela é a melhor forma de levar seu negócio. Se precisa do salário continue trabalhando, caso contrário, pode arrumar outro emprego. Ninguém que revida ordens é bem-vindo.

Apesar de falar sobre aborto ainda ser tabu em alguns países na época em que a história é ambientada – 1963 – era ainda mais. Uma moça de respeito não podia ficar grávida sendo solteira, tinha que manter relações somente após o casamento e fazer um aborto era uma questão moral, além de ser pecado perante a igreja.

Protagonismo feminino
Quando descobrimos que os pais também decepcionam os filhos

Não à toa Penny precisou contratar um médico clandestino que nem ao menos tinha diploma. E, ao invés de seguir todos os procedimentos de segurança quase a matou.

Relacionamentos entre pais e filhos geralmente são delicados. Há uma linha tênue entre crescer e não decepcioná-los quanto ao que esperam de nós. O Sr. Houseman sempre deu bons exemplos à Baby e a ensinou ser uma pessoa correta e fazer o que julgasse certo.

No entanto, quando ela toma suas próprias decisões, quando se arrisca para ajudar aqueles que acabou de conhecer e trilha um caminho que surpreende seu pai ele diz se sentir desapontado com ela. Está tudo bem desde que ela faça tudo o que ele manda? Que ela pense e aja como Lisa? Os pais precisam confiar que fizeram um bom trabalho e deixar os filhos escolherem os próprios caminhos, cometer os próprios erros.

Por último e mais importante a transformação que Baby provocou na vida de Johnny. Quando ele pensava que aquele era o único caminho, a única opção, era toda a sua vida, ela mostrou que era possível mudar tudo. Tomar as rédeas da própria vida e seguir em outra direção. Ser mais do que um simples empregado. Há um mundo de oportunidades fora do resort.

Clássico anos 80
Baby como protagonista de sua própria vida

Até então aquele era o único mundo que Johnny conhecia. Dançar, ser rebelde e seduzir algumas senhoras em troca de dinheiro fácil. Mas Baby mostrou que ele podia sim ser o que quisesse. Poderia dizer não a tudo aquilo e fazer seu próprio destino.

Enquanto Baby procurava seu lugar no mundo porque não se encaixava no ambiente que conhecia, Johnny já tinha se convencido de que não havia mais nada além daquilo. Mesmo sem saber, num primeiro momento, ambos transformaram a vida um do outro.

Dirty Dancing é um daqueles clássicos que nos permite um novo olhar cada vez que assistimos. É fácil ter simpatia pela Baby, querer conhecer alguém como ela, e porque não ser sua amiga? Sua coragem, bravura, bom coração nos conquistam desde as primeiras cenas.

A trilha sonora é algo que dispensa comentários. É uma das mais marcantes que já ouvi. O que dizer de She’s like de wind cantada por ninguém menos que Patrick Swayze? Uma das mais lindas na minha opinião. I’ve had the time of my life marcou minha adolescência. Conheci Bill Medley e Jennifer Warnes quando fazia aulas de ginástica rítmica no convento. Além de clássico é um filme que me marcou de várias maneiras.

Dirty Dancing
Uma das melhores atuações de Jennifer Grey

Uma pena a Jennifer Grey não ter outros grandes sucessos além de Curtindo a vida adoidado ao lado do Matthew Broderick. Sempre achei que ela tinha grande potencial como atriz. Ser mais conhecida como a Anne Hathaway, Abigail Breslin ou Saoirse Ronan. Pelo menos aqui no Brasil esses são os dois filmes mais divulgados. Recentemente ela atuou em Bittersweet Symphony mas não chegou a ser exibido nos cinemas por aqui.

É um filme que conquistou gerações. Depois dele vieram Dirty Dancing 2 – Noites de Havana (inclusive assisti semana passada). Conta com a participação de Patrick Swayze porém num papel menor. Também Dirty Dancing (2017) trazendo no elenco Abigail Breslin como “Baby” mas não superou as expectativas. Um dos remakes mais fracos que já assisti.

Talvez eu seja um pouquinho conservadora mas acredito que em alguns casos as produções originais sejam melhores. Carrie, Psicose, Karatê Kid são exemplos disso.

+ Leia também: 5 clássicos dos anos 80 para você assistir

Por hoje é isso. Espero que tenha gostado do momento nostalgia dessa semana. Agora me conta qual filme te traz essa sensação? Aquele antigo que você não se cansa de assistir, sempre indica para alguém ou traz lições importantes?

Até o próximo post, Érika 💛

Nos acompanhe nas redes sociais
Facebook ♡ Instagram ♡ Twitter ♡ Pinterest

Posts Similares

31 Comentários

  1. Eu amo esse filme! O engraçado que quando eu assistia na adolescência eu só via o lado romântico e sensual do filme, na fase adulta pude perceber o quanto é real e complicados os assuntos inseridos na trama. O mais engraçado é que o Patrick e a Jennifer não se davam muito bem, e na tela ninguém percebe! Beijos, adorei o post!

  2. Olá Érika, tudo bem?

    Não sei quantas vezes já vi esse filme, mas não foram todas as vezes que vi completo, pois só via pedaços. Os assuntos abordados no filme são realmente um tabu, principalmente ela época em que foi lançado. Essa questão do aborto é bem delicada e amo o protagonismo feminino, pois considero algo bem importante. Gostei demais do seu post!

    Beijos!

  3. Olá, tudo bem? Interessante a sua análise acerca. Vou confessar que apesar de quase ser um clássico do pop, nunca assisti. Nunca surgiu a oportunidade, e acabou que sempre fui adiando. Gosto do fato de apesar de ser um filme já antigo, ele tem seus momentos de trazer temáticas importantes a serem debatidas, ainda hoje, que dirá na época. Amei demais a postagem!
    Beijos

  4. Deixa só eu eu entender algo: Dirty Dancing tem remake? Eu não sabia disso. Para mim só havia original mesmo e ponto.
    Amei demais sua percepção sobre a personagem e enredo. Deu até uma vontade de assistir novamente, eu gosto muito dos clássicos de filmes. Principalmente, por conta da imagem.

  5. Oi Erika, tudo bem ?
    É engraçado como temos filmes antigos que estavam tão a frente do seu tempo. Eu amo desde criança, e em cada época por questões diferentes.
    É um filme intenso e forte para quem sabe reconhecer.
    Fiquei com vontade de assistir de novo rsrs
    Sabe se está disponível em algum dos serviços de streaming ?
    Beijos

  6. Oi Erika!
    Assisti a esse filme nem sei quantas vezes, amo kkk. Adoro desde a dança, o enredo bem feito e a maturidade de Baby diante das circunstancias pois a descriminação era muito visível. Adorei sua resenha me deixou com vontade de assistir de novo e as músicas então são demais, parabéns pela resenha, bjs!

  7. Oi!
    Sempre ouvia muitos comentários sobre o filme, como era um clássico e tudo o mais e confesso que a obra me surpreendeu por abordar tópicos que vão além do romance. Sempre estranhei como não comentavam quanto as críticas que tinham no filme que foram bem elaboradas e inseridas na trama. Enfim, gostei do filme, mesmo não tendo gostado de alguns pontos do comportamento da Baby como ela correr atrás do mocinho em alguns momentos. Mas enfim, é uma boa obra e com certeza entendo o motivo de ser considerado um clássico atemporal.

    Ótima crítica!

    Abraços,
    Andy –StarBooks

  8. Oi Érika!

    Eu conheço o filme mas assisti faz tanto tempo que nem lembro de ter reparado em tudo isso que você falou no teu artigo. Agora tô com vontade de ver novamente, dessa vez com um olhar mais critico pra sentir tudo isso.
    Adorei seu texto, ficou simplesmente incrivel!!

  9. Eu já conhecia esse filme, apenas não o assisti de forma completa e não lembro o motivo, talvez fosse jovem demais e na época não tenha despertado muito interesse em mim, mas isso é uma especulação minha. É interessante saber que o filme aborda temas que foram tabus nos anos de 1960, pois os filmes também servem para isso, quebrar tabus e paradigmas, abrir as cabeças das pessoas. Eu simplesmente adorei a sua crítica/texto, arrasou!!

    Abraços!

  10. Sensacional! Adoro quando o filme traz aquela sensação de nostalgia, conta com trilha sonora marcante e que dispensa comentários e ainda contém lições importantes. Um filme assim, que eu indico pra todo mundo é A Fantástica Fábrica de Chocolates.

  11. Eu adorei!
    Eu fiquei chocada que tem o 2, fui até pesquisar depois de ler sua crítica em relação a Dirty! E Eu concordo plenamente com muitas das coisas que disse, principalmente em relação ao que a gente encontra, como por exemplo, a disputa de classes e a falta de valor ao empregado, claro que a questão do abordo e da posição da mulher! Sensacional, vou reassistir e assistir o 2! PS: Fiquei com 0 vontade de ver o remake

  12. esse filme é pra mim um clássico e gosto da sua perspectiva dele, de abordar esses temas tabus dos anos 60 que sinceramente ainda são presentes e tabus nos dias de hoje, esse filme pra mim represente de certa forma um empoderamento.

  13. Esse é um dois filmes que mais adorei assirtir, triste quando esses ator faleceu em plena carreira, ele foi dançarino antes de ser ator, então o filme dele realmente arrasou com a performance com a bela música e apresentação. É um dos filmes mais lindos que todo mundo com certeza, sempre voltam assirtir de novo!

  14. Acredita que nunca vi esse filme na integra? Não sabia desses detalhes.. bem interessante. Vou ver se acho nos app de filmes. Esses outros que você citou já vi alguns. Clássicos atemporais.

  15. Eu amava assisti esse filme, perdi as contas de quantas vezes assisti, mas mesmo assim não lembrava da parte do aborto, gostei do post, saudades dos tempos bons.

  16. Erika, meu Deus, que post! Não tenho condições de fazer um comentário à altura do seu post… Sinto muita emoção, saudosismo e amor. Esse é um dos filmes da minha vida. Assisto uma vez por ano, tendo assistido ele há dois domingos (e Curtindo a Vida Adoidado, no sábado passado). PS: Vou assistir Os Goonies essa semana com o marido que nunca viu…
    Eu sou totalmente apaixonada por Dirty Dancing, pela trilha e sobretudo, pelo Patrick. Tenho 2 DVDs do filme, sendo um, comemorativo. Tenho uma lata especial com alguns filmes do Swayze também.
    Enfim, eu fiquei presa nesse seu post e não queria mais sair dele. Nossa, como é bom ler algo tão bem explicado e interpretado. Apaixonada aqui.
    Espero conseguir acompanhar mais momentos de nostalgia no seu blog. Grande abraço.

  17. Esse filme é maravilhoso mas o que toca mesmo é o Ghost. Sempre choro quando assisto, acho que precisamos desse tipo de sensação em certos momentos de nossa vida, porque eles tem a capacidade de acordar a nossa humanidade.Adorei seu post,bjus.

  18. Esse filme é incrível mesmo. Cada lição que ele nos ensina, além de todo charme das danças e das músicas são memoráveis. De filmes antigos, eu gosto muito de De Volta pro Futuro e Curtindo a Vida Adoidado.

  19. Confesso que ando numa vibe nostalgia, antes filmes eram interessantes como esse, hoje em dia é só lacração, e eu que amo um cineminha estou deixando de lado porque perdeu a graça … Amo esse filme e ainda assisto de vez em quando pela falta de bons filmes no mercado!

  20. Oi
    Que postagem maravilhosa!
    Ler sobre esse filme deu uma nostalgia boa, já assisti esse filme inúmeras vezes e sempre fico animada quando revejo 😀
    Gosto muito dos filmes dos anos 80

  21. Oi! Que maravilha 🙂 eu simplesmente amo este filme é um clássico, tenho a trilha sonora na minha playlist 💛

  22. Este filme é muito bonito, creio que marcou a adolescência de muitos e não há remake que consiga supera-lo. O meu preferido de anos, que já assisti muitas e muitas vezes é Sociedade dos Poetas Mortos.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *